As grandes revoluções tecnológicas surgem sempre com o
intuito de facilitar a vida das pessoas, mas cada vez mais estes facilitadores
servem para corromper a unidade do Ser.
Posso dizer que sou abençoado por pertencer a última geração
que na infância ainda tinha os brinquedos como companheiros.
Quando os adultos se visitavam, as crianças eram mandadas
para brincar com os outros, até algum tempo atrás eles eram convidados para uma
disputa no videogame e hoje em dia eles ficam sentados com os fones enfiados no
ouvido, jogando ou nas redes sociais.
Lembro que entre o telejogo (acredito ter sido o primeiro
videogame criado), uma espécie de jogo de tênis onde cada "atleta"
era um traço na tela e a bola um quadrado, e que só tinha este jogo, e ir jogar
bola, brincar com os bonecos e carrinhos, rabiscar livros de colorir, o
telejogo ficava como última escolha, até porque como era ligado na televisão e
pouquíssimas famílias tinham mais do que uma em casa, a concorrência quase
sempre era vencida pelos adultos. Isso já na metade final dos anos 70.
Algum membro adulto da família normalmente ficava em casa,
sendo o responsável por cuidar e educar as crianças, babas e domésticas eram
exceções.
O brincar com os irmãos e amigos era mais interativo e
agregador. Mesmo quando haviam disputas (taco, futebol, vôlei, botão, guerrinha
de funda, ...), assim que acabava rolava aquela deitação sadia nos perdedores.
Por não existir um acesso facilitado as televisões,
criávamos brinquedos, carrinhos feitos de lata de azeite, lanternas com uma
lata e uma vela para explorar as obras do bairro, carrinhos de rolimã, até a
bola muitas vezes era feita com jornal e outro objetos que preenchiam uma meia.
Com o advento dos videogames, os jogos eletrônicos ganharam
um novo fator, a violência.
Tu tinhas 3 vidas, o que na vida real não existe. Tu matavas
o teu "inimigo" no jogo e quando tu começavas o jogo novamente ele
estava vivo, assim como tu podias morrer várias vezes, mas sempre estavas vivo.
Mesmo que muita gente diga que não, este conceito de múltiplas vidas vai se
incorporando a personalidade da criança, ainda mais nos dias atuais em que elas
praticamente já nascem vendo este tipo de coisas nos desenhos e outros
programas que lhes são empurrados pelas "babás modernas".
A revolução feminina, com as mulheres deixando de ser do
lar, para irem buscar uma profissão fez com que o porto seguro das crianças
fosse transferido dos "adultos" familiares (normalmente mãe, avó, tia
ou prima eram quem cuidavam das crianças) para pessoas estranhas (empregada/baba,
escolinhas cada vez mais cedo, ...) e/ou para os meios audiovisuais (televisão,
videogame, computador, smartphone).
Pelo lado positivo, os pequenos passaram a conviver desde
cedo com um "mundo" mais amplo de ideias e possibilidades, mas como
contraponto, eles perderam a ancoragem do Ser Infantil, de aproveitar a fase do
brincar, do experimentar/criar. Quase tudo que chega até eles vem pronto, sendo
que as propagandas e o merchandising praticamente ditam o que tu deves ou não
fazer para seres do grupo dos melhores.
Com o distanciamento entre os pais e os filhos pequenos,
estes últimos passaram a ser fortemente influenciados pelas mídias. O que antes
era feito de forma velada (nos filmes em preto e branco não se via sangue se o
filme não fosse de terror) passou a ser praticado de forma aberta. Games,
filmes, novelas e revistas ficaram cada vez mais "sensacionalistas", tentando
aproximar cada vez mais o seu produto da realidade física. Violência, sangue,
pancadaria, falcatruas, extorsão, nudez, baixaria vão sendo enfiados no cotidiano
das crianças, roubando sua inocência, criando um vácuo moral na ligação entre o
mundo exterior e o Ser Interior delas.
A necessidade do ter que o mundo exterior prega aliada ao
inconsciente desejo dos pais compensarem a sua ausência dando presentes, torna
os pequenos em objetos consumidores. Os produtos preenchem a lacuna que o convívio
familiar deixa. O Amor da família é trocado pelo "calor", mesmo que
frio, do mundo virtual. Esta troca gera nos adultos uma enorme carência
afetiva, que muitas vezes se tenta suprir com os "pets".
Percebo que nestes 41 anos que vivi houve um aumento na
violência entre humanos, contra animais, da pobreza, da miséria, da
desigualdade, um distanciamento cada vez maior das pessoas, uma fome crescente
de poder/ter, os danos ao meio ambiente, a degradação moral/ética, o uso de
drogas sociais/prescritas, enfim, uma alienação quase que total do Ser
Integral.
Agora eu pergunto: Vale mesmo a pena?
Porto Alegre, 22 de março de 2014.
Carlos Eduardo.
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