sábado, 22 de março de 2014

Divagando a alienação do Ser Integral.

As grandes revoluções tecnológicas surgem sempre com o intuito de facilitar a vida das pessoas, mas cada vez mais estes facilitadores servem para corromper a unidade do Ser.
Posso dizer que sou abençoado por pertencer a última geração que na infância ainda tinha os brinquedos como companheiros.
Quando os adultos se visitavam, as crianças eram mandadas para brincar com os outros, até algum tempo atrás eles eram convidados para uma disputa no videogame e hoje em dia eles ficam sentados com os fones enfiados no ouvido, jogando ou nas redes sociais.
Lembro que entre o telejogo (acredito ter sido o primeiro videogame criado), uma espécie de jogo de tênis onde cada "atleta" era um traço na tela e a bola um quadrado, e que só tinha este jogo, e ir jogar bola, brincar com os bonecos e carrinhos, rabiscar livros de colorir, o telejogo ficava como última escolha, até porque como era ligado na televisão e pouquíssimas famílias tinham mais do que uma em casa, a concorrência quase sempre era vencida pelos adultos. Isso já na metade final dos anos 70.
Algum membro adulto da família normalmente ficava em casa, sendo o responsável por cuidar e educar as crianças, babas e domésticas eram exceções.
O brincar com os irmãos e amigos era mais interativo e agregador. Mesmo quando haviam disputas (taco, futebol, vôlei, botão, guerrinha de funda, ...), assim que acabava rolava aquela deitação sadia nos perdedores.
Por não existir um acesso facilitado as televisões, criávamos brinquedos, carrinhos feitos de lata de azeite, lanternas com uma lata e uma vela para explorar as obras do bairro, carrinhos de rolimã, até a bola muitas vezes era feita com jornal e outro objetos que preenchiam uma meia.
Com o advento dos videogames, os jogos eletrônicos ganharam um novo fator, a violência.
Tu tinhas 3 vidas, o que na vida real não existe. Tu matavas o teu "inimigo" no jogo e quando tu começavas o jogo novamente ele estava vivo, assim como tu podias morrer várias vezes, mas sempre estavas vivo. Mesmo que muita gente diga que não, este conceito de múltiplas vidas vai se incorporando a personalidade da criança, ainda mais nos dias atuais em que elas praticamente já nascem vendo este tipo de coisas nos desenhos e outros programas que lhes são empurrados pelas "babás modernas".
A revolução feminina, com as mulheres deixando de ser do lar, para irem buscar uma profissão fez com que o porto seguro das crianças fosse transferido dos "adultos" familiares (normalmente mãe, avó, tia ou prima eram quem cuidavam das crianças) para pessoas estranhas (empregada/baba, escolinhas cada vez mais cedo, ...) e/ou para os meios audiovisuais (televisão, videogame, computador, smartphone).
Pelo lado positivo, os pequenos passaram a conviver desde cedo com um "mundo" mais amplo de ideias e possibilidades, mas como contraponto, eles perderam a ancoragem do Ser Infantil, de aproveitar a fase do brincar, do experimentar/criar. Quase tudo que chega até eles vem pronto, sendo que as propagandas e o merchandising praticamente ditam o que tu deves ou não fazer para seres do grupo dos melhores.
Com o distanciamento entre os pais e os filhos pequenos, estes últimos passaram a ser fortemente influenciados pelas mídias. O que antes era feito de forma velada (nos filmes em preto e branco não se via sangue se o filme não fosse de terror) passou a ser praticado de forma aberta. Games, filmes, novelas e revistas ficaram cada vez mais "sensacionalistas", tentando aproximar cada vez mais o seu produto da realidade física. Violência, sangue, pancadaria, falcatruas, extorsão, nudez, baixaria vão sendo enfiados no cotidiano das crianças, roubando sua inocência, criando um vácuo moral na ligação entre o mundo exterior e o Ser Interior delas.
A necessidade do ter que o mundo exterior prega aliada ao inconsciente desejo dos pais compensarem a sua ausência dando presentes, torna os pequenos em objetos consumidores. Os produtos preenchem a lacuna que o convívio familiar deixa. O Amor da família é trocado pelo "calor", mesmo que frio, do mundo virtual. Esta troca gera nos adultos uma enorme carência afetiva, que muitas vezes se tenta suprir com os "pets".
Percebo que nestes 41 anos que vivi houve um aumento na violência entre humanos, contra animais, da pobreza, da miséria, da desigualdade, um distanciamento cada vez maior das pessoas, uma fome crescente de poder/ter, os danos ao meio ambiente, a degradação moral/ética, o uso de drogas sociais/prescritas, enfim, uma alienação quase que total do Ser Integral.
Agora eu pergunto: Vale mesmo a pena?
Porto Alegre, 22 de março de 2014.

Carlos Eduardo.


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