terça-feira, 14 de setembro de 2010

Divagando sobre minhas experiências de vida

Estava aqui relembrando fatos passados.
Passei por uma experiência bastante interessante a aproximadamente 10 anos.
Nesta época eu participava de um grupo que realiza trabalhos voluntários dentro de algumas instituições psiquiátricas e também numa casa prisional.
O primeiro contato que tive com este trabalho aconteceu dentro do Hospital Psiquiátrico São Pedro.
Por ser feito dentro de instituições, uma das regras é que não podíamos entrar sozinhos nas instituições. Deveríamos esperar que todos os integrantes do grupo estivessem no local para podermos ingressar.
Cheguei no São Pedro no horário marcado. Fiquei no portão esperando pelo restante do grupo. Como já faziam 15 minutos e não tinha sinal dos outros, me dirigi a portaria para saber se eles já estavam por lá. O guarda me informou que estavam lá dentro e que era para eu entrar. Achei estranho, mas entrei mesmo assim.
Por ser a minha primeira visita, estava mais perdido que cego em tiroteio. Havia perguntado em qual dos prédios era o trabalho e o segurança me disse que seria no primeiro prédio.
Como ainda não conhecia o São Pedro, que diga-se de passagem é muito lindo por dentro, fui caminhando lentamente, procurando "sentir" o ambiente.
Ao chegar na porta do prédio, vem a segunda surpresa do dia. Não havia nenhum sinal de vida.
Entrei no edifício. Era um longo corredor, sem iluminação. A única claridade que percebia vinha das portas das diferentes salas e, mesmo assim, eram apenas vestigios da luz do dia que entrava pelas janelas de cada compartimento.
Continuei avançando pelo corredor, ao mesmo tempo em que sentia odores fortes de urina e fezes, que se misturavam a penumbra, também sentia uma Energia extremamente leve me envolvendo. Ao passar pelas duas primeiras salas, que ficam de frente uma da outra, levei um choque. Ambas estavam completamente vazias, sem nenhuma mobilia. Segui adiante e a cena se repetia a cada sala que eu passava. No final do corredor havia uma escadaria que dava acesso ao segundo andar do prédio. Respirei fundo, conversei com meu anjo da guarda e subi os lances de degraus.
O visual no andar superior era praticamente o mesmo do térreo. Outro longo corredor, sem luz.
A esta altura, já sabia que a informação de que o trabalho que realizaríamos no São Pedro não se daria neste prédio, mas a curiosidade me fazia percorrer este andar por completo.
Ao adentrar no corredor, uma sensação muito estranha se apossou de mim. Senti minha espinha se arrepiar completamente. Cada passo que eu dava, fazia com que eu fosse sendo tragado pela escuridão. Parecia que as paredes se movimentavam, de forma parecida ao movimento realizado pelo nosso estômago quando recebe alimento. Continuei em frente, como se estivesse sendo empurrado para o fim do corredor. Passava pelos conjuntos de salas e todas eram iguais, sem móveis e sem nenhuma forma de vida.
Quando estava defronte ao último par de salas, me deparei com uma cena que me chocou tremendamente. Numa das salas estavam 3 pessoas. Todos completamente nús. Um deles falava sem emitir um único ruído sequer. O segundo estava deitado no meio das fezes e urina, em posição fetal. Já o último dos integrantes deste grupo enrolava algo que me pareceu ser grama numa folha de jornal e tentava fazer um palheiro. Me detive na entrada desta sala por um tempo que nem eu mesmo consigo calcular. Podem ter sido segundos, mas parecia uma eternidade.
Quando consegui me virar para a outra porta, que estava atrás de mim, percebi que ali havia uma senhora. Usava um lençol como roupa. Ao me ver ela deu um sorriso e logo depois começou a chorar, freneticamente.
Os gritos dela me fizeram despertar. Recuei e me encaminhei para a escada. Apesar de ter feito todo o trajeto até a porta de entrada em questão de segundos, parecia que uma força tentava me prender dentro daquelas paredes.
Quando estava novamente ao ar livre, senti os raios do sol baterem na minha pele, o ar fresco da manhã enchia meus pulmões. Ao mesmo tempo, fui tomado de uma sensação de alívio. Pude ouvir claramente doces vozes me dizendo que estava tudo bem, que eu não pertencia aquele ambiente, mas que deveria fazer tudo ao meu alcance para ajudar aquelas pessoas que eram internadas naquele local. Me mostraram que muitos dos internos precisavam do carinho e da atenção que tínhamos a oferecer.
Acabei descobrindo onde seria realizado o nosso trabalho. Ao final do mesmo, fizemos uma reunião de avaliação e narrei tudo que me ocorreu.
Pude perceber as lágrimas que rolavam nos rostos do restante do grupo, que me agradecia por ter proporcionado a eles uma lição que ficaria para sempre gravada em suas memórias.

Tenham muita luz, paz, harmonia e Amor.
Carlos Eduardo

Porto Alegre, 14 de setembro de 2010.